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AS DIFICULDADES E OS TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM

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22/05/2018 - Artigos

AS DIFICULDADES E OS TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM

AS DIFICULDADES E OS TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM

AS DIFICULDADES E OS TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM

 Grande parte das queixas nas escolas públicas ou privadas gira em torno das dificuldades que crianças e adolescentes tem em relação ao processo de aprendizagem.   As intervenções psicológicas relacionadas as dificuldades de aprendizagem tem como principal objetivo entender os porquês de uma criança não aprender. 

Em todas as salas de aulas, seja de crianças, adolescentes e/ou adultos, existem alunos que aprendem os conteúdos com maior ou menor facilidade. Nenhum aluno está livre, em algum momento, de tirar notas baixas.  Mas quando os prejuízos de desempenho escolar/acadêmico podem ser mais do que simples dificuldades pontuais (despreparo para uma prova específica, o “branco” causado por alto nervosismo, falta de planejamento de estudo, etc)?

Você sabia que pesquisas apontam que países como o Brasil 40% dos alunos de séries iniciais têm dificuldades de aprendizagem? Destes, apenas 6% possuem algum distúrbio de origem biológica/neurológica?

Estamos falando das “Dificuldades da Aprendizagem e dos Transtornos de Aprendizagem”.  É importante compreender que nem toda dificuldade na aprendizagem causado por um transtorno de aprendizagem.

Quando as dificuldades para aprender são persistentes e apresentam limitações e/ou impedimentos para a aprendizagem dos alunos, podemos estar nos deparando com os chamados  “transtornos e/ou dificuldades de aprendizagem”. 

Normalmente os professores não são preparados para identificar o que impede ou limita seu aluno de aprender. O adequado diagnósticos dos transtornos e/ou das dificuldades de aprendizagem não é tarefa simples e exige avaliação por uma equipe multiprofissional (psicólogos, psicopedagogos, fonoaudiólogos, neuropsicólogos, neurologistas, psiquiatras, entre outros).   

Muitas crianças, jovens e adultos apresentam dificuldades e/ou transtornos de aprendizagem que prejudicam ou limitam suas capacidades de adaptação e sucesso escolar e/ou profissional. Porém passam anos, às vezes décadas, sem o adequado diagnóstico e tratamento, o que acarreta grandes prejuízos em suas vidas. 

Estas demandas podem chegar ao profissional psicólogo de formas diversas, dependendo da relação e contexto do atendimento prestado. Enquanto para o psicólogo na área clínica essa busca pelos serviços, normalmente, ocorre diretamente pelos pais ou responsáveis da criança que apresenta tais dificuldades, quando percebem as dificuldades da criança/ovem para apreender (ex. dificuldades de atenção, na leitura, em realizar as atividades escolares em casa), reforçada, geralmente, pelo desempenho escolar ruim.  Já para o profissional que presta serviço diretamente para a escola, as fontes iniciais de informações sobre as dificuldades de aprendizagem da criança e/ou adolescente são os demais profissionais da escola (professores e/ou coordenadores pedagógicos, principalmente).  

As diferentes formas de acesso ao serviço psicológico devem ser consideradas na intervenção e avaliação psicológica, principalmente quando se trata do público infantil e/ou adolescente. Normalmente, os familiares possuem uma percepção mais subjetiva e exagerada dos sintomas do filho/parente. Já os outros profissionais da escola tendem a prestar informações mais objetivas em seus relatos sobre suas observações da criança e/ou adolescente a respeito do ambiente escolar (padrão de relacionamentos e interação, dificuldades nas atividades e tarefas escolares e em sala de aula). Porém apresentam pouco ou nenhum conhecimento sobre o desenvolvimento físico, emocional e social da criança, além de desconhecimento de informações de outros contextos (social, familiar, saúde...) importantes para fundamentar o processo avaliativo, informações obtidas principalmente com os familiares e, de forma complementar, com outros profissionais que estão fora do ambiente escolar (fonoaudiólogo, médicos, terapeutas ocupacionais, ...).

Salienta-se que existe uma proporção considerável de diferença entre a queixa trazida aos serviços psicológicos (pais, escolas, outros profissionais) para o que realmente está acontecendo com a criança e/ou adolescente, o problema que ele enfrenta e as causas do mesmo. É muito comum, após o processo investigativo (entrevistas, testes psicológicos, exame clínico psicológico, atividades lúdicas e jogos, etc) constatar que a questão não é de origem de dificuldades de aprendizagem da criança, mas envolve outros processos/contextos que tem interferido na aprendizagem do aluno. Muitos destes fatores envolve o próprio processo de ensino-aprendizagem (condições inadequadas, professores despreparados para lidar com as diferenças dos alunos,...), contextos sociais, problemas e conflitos familiares, eventos marcantes e de difícil assimilação pela criança, como a chegada de um irmão mais novo, situações traumáticas, problemas físicos (visão, por exemplo), entre outros. 

AVALIAÇÃO DAS DIFICULDADES E DOS TRANSTORNOS DA APRENDIZAGEM 

Atualmente as dificuldades e os transtornos de ensino e aprendizagem estão muito presentes no cenário escolar e acadêmico. Sendo muito importante a compreensão dos processos do ensino-aprendizagem, as condições e variáveis que interferem diretamente nesta relação, bem como na identificação dos principais métodos, técnicas e instrumentos que auxiliam ao profissional na avaliação das dificuldades e transtornos relacionados aos problemas de aprendizagem.

Para os especialistas e estudiosos da área, os Transtornos da Aprendizagem são gerados por fatores biológicos/neurológicos/genéticos, sendo classificados comumente como: Dislexia, Discalculia, Disortografia.

Já as chamadas Dificuldades de Aprendizagem podem ser multifatoriais, desde situações relacionadas ao sistema educacional deficitário, a problemas familiares e emocionais do aluno, a presença de doenças/condições físicas (visão, desnutrição, ...), a falta de atenção/suporte para aluno aprender, bem como presença de outros transtornos psicológicos e/ou do desenvolvimento, como TDAH (atenção e hiperatividade), autismo, deficiência intelectual, doenças emocionais, etc. 

Os Transtornos de Aprendizagem. Existem divergência e diferentes conceituações sobre a compreensão dos transtornos de aprendizagem. Na 5º edição do DSM (Manual de Diagnóstico e Estatístico, DSM-5) os Transtornos de Aprendizagem encontram-se classificados na secção 2, categoria dos Transtornos de Neurodesenvolvimento. O DSM-5 define que os transtornos de Aprendizagem Específicos são gerados por uma desordem no neurodesenvolvimento, que tem origem biológica, incluindo fatores genéticos, epigenéticos e ambientais. Assim, os transtornos de aprendizagem têm como base um transtorno cognitivo que interfere na habilidade de receber e analisar informações importantes para o processo de aprendizagem.

Segundo o DSM-5 os transtornos de Neurodesenvolvimento o “são um grupo de condições com início no período do desenvolvimento. Os transtornos tipicamente se manifestam cedo no desenvolvimento, em geral antes de a criança ingressar na escola, sendo caracterizados por déficits no desenvolvimento que acarretam prejuízos no funcionamento pessoal, social, acadêmico ou profissional”.

Conceitua ainda, o DSM-5, que os déficts do desenvolvimento podem variar de limitações específicas na aprendizagem ou no controle de funções executivas até prejuízos globais em habilidades sociais ou inteligência. 

Enquanto  a  dificuldade  de  aprendizagem  se  refere  a  um  conjunto  de  vários problemas  de  aprender,  que  podem  ser  características  temporárias  ou  permanentes  que constroem um risco educacional e modificam o desenvolvimento de aprendizagem do aluno o transtorno  de  aprendizagem  implica  em  significativas  dificuldades  na  aquisição  ou  uso  da leitura, escrita, fala, raciocínio, audição ou habilidades matemáticas são alterações intrínsecas ao indivíduo  e presumidas como  devidas à disfunção do sistema nervoso central  (Hammil, 1998 apud Fernandes,2016).  

Para o Código Internacional das Doenças, em sua 10º edição (CID-10), os transtornos relacionados ao processo de ensino-aprendizagem estão classificados na categoria Transtornos do Desenvolvimento Psicológicos (F80-F89), diferenciando nesta categoria, com suas subdivisões, os transtornos: transtornos específicos do desenvolvimento da fala e linguagem (F80); Transtornos específicos do desenvolvimento das habilidades escolares (F81); Transtorno específico da função motora (F82); Transtornos específicos mistos do desenvolvimento (F83); Transtornos invasivos do desenvolvimento (F84); Outros transtornos do desenvolvimento psicológico (F88); Transtorno não especificado do desenvolvimento psicológico (F89).

 

Os Transtornos Específicos do Desenvolvimento das Habilidades Escolares – DEDHE (CID F81)

Esses são transtornos nos quais os padrões normais de aquisição de habilidades estão perturbados desde os estágios iniciais do desenvolvimento. Originam-se de anormalidades no processo cognitivo, que derivam em grande parte de disfunções biológicas. 

Os transtornos  específicos  do  desenvolvimento  das  habilidades  escolares  (DEDHE)  compreendem  o grupo  de  transtornos  manifestados  por comprometimentos específicos e significativos no aprendizado de habilidades escolares. Esses comprometimentos no aprendizado não são resultado direto de outros transtornos (retardo mental, perturbações emocionais, problemas visuais/auditivos, déficits neurológicos...) apesar de poderem ocorrer simultaneamente. Os DEDHE ocorrem frequentemente junto com outras síndromes clínicas (TDAH, transtorno de conduta, ...) e outros transtornos do desenvolvimento da função motora ou específicos da fala e linguagem. 

Dificuldades para o diagnóstico diferencial: Falta de meios diretos e exatos para distinguir dificuldades escolares decorrentes da falta de experiências adequadas (escolares, familiares, sociais..) daquelas decorrentes de algum transtornos individual; dificuldades em relação ao adequado levantamento de informações acerca do desenvolvimento psicológico do avaliado; A maturação biológica e o nível de habilidades de uma criança dependerá das circunstâncias familiares e da escolaridade e de suas características individuais. 

- Transtorno Específico da Leitura (F81.0) – comprometimento específico e significativo no desenvolvimento das habilidades de leitura. 

- Transtorno Específico do Soletrar (F81.1) – comprometimento específico e significativo no desenvolvimento das habilidades de soletrar, na ausência de histórico de F81.0. 

- Transtorno misto das habilidades escolares (F81.3) – categoria residual e mal definida, em casos em que ambas as habilidades (aritmética e de leitura ou de soletrar) estão significativamente comprometidas

- Outros transtornos do desenvolvimento das habilidades escolares  (F81.8) 

- Transtornos específico do desenvolvimento das habilidades escolares, não especificado (F81.9) 

 

Critérios diagnóstico dos Transtornos Específico da Aprendizagem 

A. Dificuldades na aprendizagem e no uso de habilidades acadêmicas, conforme indicado pela presença de ao menos um dos sintomas a seguir que tenha persistido por pelo menos 6 meses, apesar da provisão de intervenções dirigidas a essas dificuldades:

1. leituras de palavras de forma imprecisa ou lenta e com esforço;

2. Dificuldades para compreender o sentido do que é lido; 

3. Dificuldades para ortografar (escrever corretamente); 

4. Dificuldades com a expressão escrita; 

5. Dificuldades para dominar o senso numérico, fatos numéricos ou cálculo; E

6. Dificuldades no raciocínio. 

B.  As habilidades acadêmicas afetadas estão substancial e quantitativamente abaixo do espera-

do para a idade cronológica do indivíduo, causando interferência significativa no desempenho 

acadêmico ou profissional ou nas atividades cotidianas. 

 

C.  As dificuldades de aprendizagem iniciam-se durante os anos escolares, mas podem não se manifestar completamente até que as exigências pelas habilidades acadêmicas afetadas excedam as capacidades limitadas do indivíduo (p. ex., em testes cronometrados, em leitura ou escrita de textos complexos longos e com prazo curto, em alta sobrecarga de exigências acadêmicas).

   D.  As dificuldades de aprendizagem não podem ser explicadas por deficiências intelectuais, acuidade visual ou auditiva não corrigida, outros transtornos mentais ou neurológicos, adversidade psicossocial, falta de proficiência na língua de instrução acadêmica ou instrução educacional inadequada.

 

 Conceitos dos mais comumente usados para designar os transtornos de aprendizagem

 Dislexia - transtorno específico de aprendizagem de origem neurobiológica caracterizada por dificuldade no reconhecimento preciso e/ou fluente da palavra, na habilidade de decodificação e em soletração

Discalculia - transtorno específico de aprendizagem caracterizada por uma significativa dificuldade no conceito do número, na memorização de fatos aritméticos, na fluência e precisão do cálculo e precisão de raciocínio matemático. 

Disortografia* - transtorno específico de aprendizagem que afeta a expressão da escrita, a precisão da ortografia, organização/estruturação das frases, bem como as regras gramaticas e morfossintáticas.  

* termo não encontrado no CID-10.

 

As Dificuldades de Aprendizagem. Como dito anteriormente, estas dificuldades podem ser causadas por uma série de fatores (multifatoriais) e são responsáveis (como causa ou agravamento) da maioria dos casos relacionados aos problemas de aprendizagem escolar. Apresentamos abaixo alguns dos principais fatores relacionados às dificuldades de aprendizagem.

 

- Fatores relacionados à Escola:dizem respeito as condições da estrutura da escola; da forma que lida e oferece soluções para as dificuldades apresentadas por seus alunos; ausência de professores qualificados; os métodos e critérios avaliativos; entre outros; 

-Fatores Familiares:presença de condicionantes familiares que interferem na saúde emocional da criança e que podem direta ou indiretamente trazer prejuízos para a capacidade de “aprender” da mesma. Ex: divórcios e conflitos familiares recentes, fatos/situações de elevado nível de estresse (perda, luto, nascimento de outro filho, doença na família), desestruturação e dinâmica familiar desadaptativa, empobrecimento do ambiente e de estímulos a criança para aprendizagem, entre outros. Importante realizar a investigação de histórico familiar de transtornos mentais na família; 

- Fatores relacionados à Saúde Psicológica da criança/jovem:investigação de outros transtornos psicológicos da infância e adolescência que podem interferir diretamente no processo de ensino-aprendizagem, como: TDAH, Autismo, retardo mental /deficiências intelectuais, transtornos da comunicação, transtornos psicóticos, transtornos de condutas, uso/abuso de drogas, doenças emocionais (transtornos humor/ansiedade), alteração do sono, entre outros;

- Outros fatores relacionados à Saúde:necessidade de avaliação de outros problemas de saúde que podem estar presentes e interferem diretamente na capacidade de aprendizagem do aluno. Ex. problemas de visão, desnutrição, entre outros. 

- Fatores sociais:pesquisas tem apontado que a aprendizagem é diretamente influenciada pelas questões sociais e o contexto sociocultural em que a criança/adolescente está inserida(o). A comunidade pode (des)favorecer ao processo de ensino-aprendizagem devido a diversos fatores, como: maior/menor vulnerabilidade e dificuldades sociais/econômicas e as desigualdades sociais, dificuldades de acesso as políticas públicas (saúde, desporto, lazer, etc), o papel que a educação ocupa e é introjetado e disseminado na própria comunidade, a necessidade/motivação conflitantes com a educação (gerar rendar, ajudar em casa, etc). 

Considerações finais

                Neste artigo foi apresentado algumas questões conceituais sobre as dificuldades e os transtornos de aprendizagem. As principais diferenças entre estes e os impactos dos mesmos na vida na aprendizagem e desempenho acadêmico, principalmente, das crianças e adolescente.  Procurou-se relatar os critérios e codificações diagnósticas dos dois principais códigos internacionais de doenças (CID-10 e DSM-V) e as dificuldades da realização dos diagnósticos diferenciais. Por fim foi apresentado uma síntese dos principais fatores relacionados as dificuldades de aprendizagem.

                É importante ressaltar que as dificuldades, os problemas e/ou transtornos de aprendizagem devem ser considerados como fenômeno complexo e multifatorial, necessitando de avaliação e acompanhamento de uma equipe multidisciplinar. E que o profissional psicólogo possuí importante papel no atendimento, avaliação (psicológica e/ou neuropsicológica), nas intervenções e acompanhamento de crianças, jovens, adultos e idosos que apresentam queixas relacionadas ao “não aprender”. 

No próximo artigo discutiremos os processos de avaliação psicológica e seus principais métodos, técnicas e instrumentos para as demandas de dificuldades e/ou transtornos de aprendizagem.

Autor: Manoel Vieira de Carvalho Alencar
Psicólogo Clínico, Organizacional, Assistente Técnico demandas de Justiça do Trabalho
e Psicólogo Responsável da VISUS Consultoria
CRP15/2121

CONFIRA TAMBÉM NOSSO ARTIGO SOBRE AVALIAÇÃO DOS PROBLEMAS DE APRENDIZAGEM
 
https://visusconsultoria.com.br/artigos/avaliacao-das-dificuldades-transtornos-de-aprendizagem

Referências:

http://revistaepoca.globo.com/Sociedade/noticia/2012/08/como-detectar-transtornos-de-aprendizagem.html

https://www.terra.com.br/noticias/educacao/estudo-10-da-populacao-tem-algum-transtorno-de-prendizagem,4243db25f4e1e310VgnVCM5000009ccceb0aRCRD.html             

CID-10 Classificação Estatística Internacional de Doenças e. Problemas Relacionados à Saúde. 10a rev. São Paulo: Universidade de São Paulo; 1997. vol.1. 5.

 DSM-5 / [American Psychiatnc Association, traduç . Maria Inês Corrêa Nascimento ... et al.]; revisão técnica: Aristides Volpato Cordioli... [et al.]. - . ed . Porto Alegre: Artmed, 2014. xliv, 948 p.; 25 cm.

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