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A relação entre a personalidade e a ordem de nascimento dos irmãos

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05/02/2018 - Artigos

A relação entre a personalidade e a ordem de nascimento dos irmãos

A relação entre a personalidade e a ordem de nascimento dos irmãos

A RELAÇÃO ENTRE A PERSONALIDADE E A ORDEM DE NASCIMENTO DOS IRMÃOS

 

É comum ouvir questionamentos quanto as diferenças entre irmãos, mesmo criados no mesmo ambiente familiar, com oportunidades e convívios semelhantes, contudo apresentam personalidades tão diferentes entre si. Mas o que será que acontece para que existam tais diferenças?

Pesquisas têm revelado que os irmãos criados na mesma família são quase tão diferentes quanto indivíduos sem laços de parentesco. Há décadas psicólogos e teóricos da personalidade realizam estudos sobre a influência das interações do grupo familiar na personalidade e estilo interpessoal do indivíduo.  Um dos primeiros teóricos da Psicologia a abordar esta temática foi Alfred Adler no início do século XX.

De uma forma geral, pode-se dizer que as teorias psicológicas que estudam a influência da posição do indivíduo na genitura familiar (ordem de nascimento dos irmãos) sobre a personalidade, procuram investigar as influências das dinâmicas e interações do grupo familiar na formação da personalidade, do desenvolvimento psicológico, dos estilos interpessoais e, até mesmo, das habilidades cognitivas; estão interessadas em entender o porquê os irmãos são tão diferentes entre si.

Mas como a ordem do nascimento pode influenciar no comportamento e na formação da personalidade dos irmãos?

Segundo estas teorias da personalidade, as diferentes interações existentes dentro da mesma família, que influenciam na dinâmica familiar, nas diferenças de tratamento (afeto, tempo, atenção, cuidados...) entre pais e filhos e entre os próprios filhos, constituem um fator contributivo para a formação da personalidade dos filhos de acordo com a ordem de nascimento que estes ocupam, favorecendo desenvolvimento de certas características psicológicas que podem ser mais assertivas ou desadaptativas em relação a algumas demandas do meio. 

Apesar de nas últimas décadas a influência da ordem de nascimento dos filos sobre a personalidade ter ocupado mais 2000 estudos, atualmente estas teorias psicológicas recebem críticas no ambiente científico. Entre as principais críticas aos postulados destas teorias, citamos o fato de não considerarem outras variáveis que interferem na formação da personalidade (condições ambientais, hereditárias, culturais, biológicas e etc); carência de maiores pesquisas científicas que confirmem suas hipóteses e as dificuldades de identificação mais precisas das características psicológicas investigadas e o nexo com suas hipóteses teóricas. Porém, o interesse sobre esta temática na área da investigação do comportamento voltou a ganhar força nos últimos anos, influenciando no surgimento de novas pesquisas científicas sobre esta temática e a convicção de que a ordem do nascimento tem se reestabelecido como um fator relevante em psicologia. 

Reservamos neste artigo a apresentação de alguns dos postulados destas teorias que investigam a posição da genitura familiar. Entendemos que é preciso considerar seus postulados com cautela e criticidade, mas vale a pena conhecer algumas das características psicológicas que podem ser influenciadas pela ordem do nascimento dos filhos. Será que algumas destas caraterísticas tem algo em comum com você? 

Primogênito (irmão/irmã mais velho/a) – Os estudos realizados ao longo das últimas décadas têm dedicado certa ênfase na identificação de características e traços de personalidade dos primogênitos.  Na dinâmica familiar, pode-se dizer que o primogênito foi por certo tempo o centro das atenções (seja afetiva, dos cuidados e o tempo dedicado pelos pais, das preocupações, das expectativas, etc.) dos familiares. Com a chegada de um irmão/irmã, ocorre o que alguns teóricos denominam de “trono perdido”. Ou seja, a atenção exclusiva dos pais antes recebida, agora é dividida, às vezes não igualitariamente, para o/a novo (a) integrante da família. Este sentimento do “trono perdido” pode afetar alguns aspectos do comportamento do filho mais velho, entre comportamentos comuns estão a busca por aprovação alheia, que pode gerar um comportamento perfeccionista, controlador e ansiogênico quando adulto. Também não é incomum o desenvolvimento de alguns traços/comportamentos relacionadas à dificuldade em lidar com perdas, dividir e/ou compartilhar objetos, situações, etc. Pesquisadores têm identificado alguns comportamentos que podem ser comuns nos filhos mais velhos, tais como: são mais conservadores; tendem a ser mais convencional e tradicionalista, identificando-se mais com os pais; são mais autoritários e exercem mais o papel de liderança; são mais extrovertidos em termos de assertividade e liderança, mais responsáveis e “bem” comportados; autoconfiantes, com boas habilidades de organização; bastantes realizadores e valorizam o sucesso, sendo  mais ambiciosos; e revelam-se mais ciumentos, angustiados e medrosos. 

Segundo filho (irmão/irmã do meio) – Diferente do que ocorre com o primogênito e do caçula, o/a filho/a do meio não tem a expectativa de uma atenção parental completa. É muito comum ser o filho que recebe menos atenção da família, vivenciando uma dinâmica familiar em que precisa “negociar” atenção e espaço. Tem maior necessidade em criar um círculo íntimo de amigos. Tendem a desenvolveram habilidades diplomáticas, com maior resiliência a estressores interpessoais. Alguns estudiosos defendem que os filhos do meio se tornam pessoas menos ansiosas, despreocupadas, disponíveis para o lazer, extrovertidas e mais independentes. Profissões que necessitam de maiores habilidades sociais são escolhas comuns dos irmãos do meio.  Competitividade e a necessidade de superação constante são traços comuns e caso estabeleçam metas altas demais para si pode ocorrer maior situações de fracassos e insucesso. Estudos identificam os irmãos mais novos como mais rebeldes, menos conformistas e menos conservadores. 

Caçula (irmão/irmã mais nova) – Geralmente vivenciam uma dinâmica familiar muito diferente dos outros irmãos, principalmente do primogênito. Em primeiro lugar pesa o fato dos pais já terem maior experiência no cuidar dos filhos, apresentando-se mais seguros em relação à educação dos mesmos. Outro ponto importante é que normalmente os filhos menores enfrentam menor pressão e expectativas dos pais como ocorre com os filhos mais velhos. Isto permite, de certo modo, que os filhos caçulas sejam mais capazes de estabelecer o seu próprio ritmo de desenvolvimento e aprendizagem, sem tanta pressão ou necessidade de “agradar” os outros. Também são criados em um ambiente familiar com maior interação social (pais e os outros irmãos), isso favorece consideravelmente o desenvolvimento de boas habilidades sociais. Estudos têm identificado que os filhos caçulas tendem a serem mais seguros, prestativos e populares; mais flexíveis e abertos a mudanças; porém podem ser mais dependentes e apresentarem maior dificuldades de autonomia na vida adulta; podem ser menos ambiciosos, menos autoconfiantes em relação ao seu potencial realizador, mais rebeldes e poucos disciplinados. 

Vale salientar mais recentemente, os teóricos estão preocupados em identificar os efeitos interativos entre o sexo do indivíduo e a ordem de nascimento. Ou seja, o gênero relacionado com a ordem ocupada na genitura familiar poderá influenciar diferentemente no desenvolvimento de algumas características e traços de personalidade. 

Por fim, a ênfase atual destas teorias visa a identificação de comportamentos associados às diferentes posições ordinais, mas considerando a forma com que a criança vivencia e interpreta a situação em que nasce em relação à dinâmica da sua família. Sendo necessário identificar as estratégias desenvolvidas pela criança para lidar com as experiências do seu ambiente social com objetivo de alcançar status e reconhecimento, o que os teóricos chamam de “estilo de vida”.  Por exemplo, um segundo filho pode assumir características de uma criança mais velha em determinadas dinâmicas familiares, considerando a relação com pais e o papel assumido pelo primogênito.  Sulloway sugere que se deve avaliar a forma particular do sujeito lidar com as situações que lhe apresentam, considerando as estratégias individuais de busca de aceitação e status social que podem estar relacionadas a ordem de nascimento dos filhos.

Neste artigo vimos que existem teorias psicológicas que procuram investigar a influência das interações do grupo familiar e a ordem do nascimento dos filhos para explicar as diferenças de comportamento entre irmãos e a formação de suas personalidades. 

Você conseguiu identificar alguma característica do seu comportamento que se relaciona com os indicadores psicológicos apresentados neste artigo e com a ordem de nascimento que você ocupa entre seus irmãos? Até que ponto a ordem de nascimento e as relações interpessoais mantidas com nossos familiares influenciam em nosso comportamento e personalidade? 

Essas e muitas outras perguntas sobre o comportamento e a formação da personalidade humana são investigadas por psicólogos e teóricos da personalidade. Compreender sobre nosso comportamento e personalidade é fundamental para nos conhecermos melhor e adotarmos uma vida mais equilibrada e com relações mais saudáveis. 

Quer conhecer um pouco mais sobre nosso comportamento e personalidade? Acompanhe nossas publicações e fique ligado em nossos próximos artigos sobre esta temática. Abaixo deixarei algumas indicações para maior aprofundamento sobre o tema deste artigo. 

                         AUTOR 
       Manoel Vieira de Carvalho Alencar

      Psicólogo Clínico e Consultor Profissional 

    Especialista em Psicologia Clínica - CRP 15/2121

                                                                                                                 

Indicações para aprofundamento da temática 

Alfred Adler (1870 – 1937) – Médico e psicólogo austríaco. Desenvolveu uma teoria psicológica com ênfase nos “desejos sociais”, necessidades de superação e como as pessoas lidam com suas fraquezas (sentimentos de inferioridade e esforços compensatórios). Adota conceito de estilo de vida como um aspecto distinto do funcionamento da personalidade e relações interpessoais. Foi um dos pioneiros na investigação da ordem do nascimento e impactos na personalidade.  

Frank J Sulloway – Professor adjunto do Departamento de Psicologia da Universidade da Califórnia. Nas últimas décadas vem empregando conhecimentos da teoria evolutiva para entender como a dinâmica familiar afeta o desenvolvimento da personalidade. Realizou estudos sobre a ordem de nascimento e dinâmica familiar, os preditores comportamentais da ordem de nascimento e atitudes sociais comparando primogênitos x filhos mais novos.

Fontes

http://www.sulloway.org/~~